Um pedaço da miséria brasileira fica no Maranhão, mais precisamente a 403km de São Luís, a capital do estado. Trata-se de Marajá do Sena, um dos municípios mais pobres do Brasil. A situação é tão crítica que, durante seis meses, entre janeiro e junho, período de chuvas, a cidade fica isolada do mundo. Chegar lá é um martírio a que poucos se submetem, tamanha a quantidade de buracos na estrada, de lama e de morros com riscos constantes de deslizamentos. É preciso, ainda, atravessar o Rio Grajaú, não menos difícil e perigoso.
O centro de Marajá do Sena fica num vale que sofre inundações constantes. Na semana passada, a Unidade Escolar Teixeira Santos, localizada na avenida principal, ficou alagada: livros, cadeiras, pratos, tudo o que estava próximo ao chão foi coberto pela lama, para desespero dos estudantes.
O colégio atende mais de 600 alunos em três turnos. “Ficamos dias sem aulas. A rotina tem sido a mesma: limpamos tudo, para a chuva sujar de novo”, afirma o diretor Raimundo Nonato Teixeira de Souza.
Ele diz mais: “No período chuvoso, ficamos isolados. Os alunos que moram distante têm que vir a pé, montados a cavalo ou em mo to. Nesse período, o número de faltas é enorme”. Os estudantes já não se conformam com tanto descaso, agravado pela falta constante de energia elétrica. “Já chegamos a ficar 48 horas sem luz”, acrescenta.
A falta de infraestrutura em Marajá é desesperadora, desabafa Souza, sem nenhuma ponta de exagero. Além da interrupção no fornecimento de eletricidade, não há água encanada,saneamento básico, e os serviços de comunicação são precários. Também não há agência bancária nem hospital na cidade.
Um posto de gasolina, pouco comércio e transporte público em pau de arara sinalizam a dificuldade de viver por ali. A população sobrevive basicamente do salário pago pela prefeitura a poucos funcionários e da lavoura. “Muitos estudantes, quando terminam o ensino médio, ficam sem saber o que fazer. Não existe oferta de emprego. Assim, muitos vão para a roça ou para São Paulo cortar cana”, revela Souza.
Valmir Campelo, de 30 anos, cursa a última etapa do curso supletivo. O livro sobre o corpo humano de que ele precisa para fazer as lições está todo enlameado.
“Parei de estudar aos 19 anos, quando fazia a 8ª série. A estrada era muito difícil e, quando chegava o inverno, ficava sem transporte. Depois, casei, tive filho e tudo ficou mais difícil. Mas estou de volta à sala de aula, mesmo com toda essa situação. Terminando os estudos, penso em sair de Marajá para trabalhar no plantio de soja. Emprego aqui é muito difícil”, conta.
Ele está desempregado, mas é voluntário da Pastoral da Criança no povoado Vertente, a 6km da sede do município. A localidade recebeu luz elétrica há quatro meses, contudo, seus poucos moradores enfrentam muitas dificuldades. Antônio Frota, de 56 anos, nascido em Tianguá (CE), mora há 33 anos no vilarejo e revela que seu maior sonho é plantar verduras no sítio em que vive. “O problema é: como escoar a produção se não temos estra da adequada para isso?”, indaga.
Em Vertente, o cenário é de extrema pobreza e pessoas esquecidas pelo Brasil que avançou muito nos últimos 20 anos e reduziu parte das desigualdades sociais. Zé Carlos, conhecido como Zequinha, mora há anos no povoado e não sabe a própria idade. Aparenta 30 anos e tem deficiência men tal. Ele trabalha no preparo de terra para o plantio, é analfabeto e não tem registro de nascimento.
Roseane da Silva Conceição, de 17 anos, casa da com Raimundo de Sousa, de 22, vive há dois em Vertente. Seu filho de um ano e cinco meses ainda não foi registrado, e está grávida de três meses. Ela conta que ainda não fez o pré-na tal e não esconde a preocupação com o futuro que aguarda as crianças.
“Vivemos em um Brasil que ninguém vê, com o qual ninguém se preocupa”, afirma.
O descaso também aflige Maria da Conceição Lopes, de 22 anos. Com dois filhos, um de cinco, outro de dois anos, ela agradece a Deus todos os dias pelos meninos terem nascido no período da seca, que lhe permitiu chegar ao posto de saúde a tempo.
Vanda da Conceição Silva, de 20 anos, optou por ter os dois filhos, de dois anos e um mês de idade, no vizinho município de Paulo Ramos, apesar de ter feito o prénatal em Marajá do Sena.
“Tudo é muito difícil. Para fazer os exames em Paulo Ramos, temos que pagar e arran jar casa de alguém para ficar”, diz.
Felizmente, até este momento, não lhe faltou solidariedade dos conhecidos. Agora, só uma coisa lhe interessa: encontrar uma fonte de renda para criar os filhos. Vanda não recebe pensão do ex-marido e ainda não conseguiu ser incluída no programa Bolsa Família. Os meninos, oficialmente, não existem, pois até hoje não foram registrados.
Por - Marcus Saldanha
Fonte - O Imparcial On-Line
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